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O prazer escuro faz a solidão negra - Artigo de Opinião

O PRAZER ESCURO FAZ A SOLIDÃO NEGRA
A construção e as consequências da objetificação da mulher negra no Brasil Desde o periodo colonial, o homem branco obtinha figura de valor cultural numa sociedade que era fundamentada em status social, com isso a mulher branca era destinada a senhora do lar da qual gerava filhos e era objeto de status para os seus maridos, já para as mulheres pretas restava o estupro e a escravidão, já que essas cuidavam dos filhos e casas de seus senhores sem pagamento por sua mão de obra, além disso eram tidas como objeto sexual pelos senhores de engenho que as estupravam satisfazendo seus desejos. As mulheres negras nesse periodo colonial, em razão da escravidão, não tinham o direito a afetividade, já que não podiam questionar ou demonstrar o que sentiam enaltecendo a dominação masculina desse periodo, dominação essa que influencia o Brasil contemporâneo, um país estruturalmente racista, soxista e patriarcal.
A construção histórica de superioridade masculina é romantizada na contemporaneidade e essa romantização fundamenta a naturalização tanto do estereótipo de mulheres negras velada pelo senso comum na sociedade contemporânea, onde mulheres negras são rotuladas como as que tem curvas avantajadas e o chamado "corpo violão", tanto dos fenómenos raciais e sexistas que comportam a figura masculina como elemento opressor e proprietário de mulheres negras destinando a esses corpos um padrão racista não só de beleza, mas de existência. O padrão de beleza que ofende e limita os corpos de mulheres negras ao erótico faz perigosa e necessária a problematização dessa objetificação e gera o espaço interseccional das causas sofridas por mulheres negras no Brasil.
A sociedade contemporânea é tecnológica, isso significa que essa é uma sociedade altamente influenciada pelas midias sociais, essas cumprem um papel não só de interação ou diversão, mas também de formação de valores e imagens sociais influenciando de forma direta as relações sociais. Quando mídias sociais propagam a herança histórica da erotização de mulheres negras representando, mesmo que em sua maioria de formas veladas, o estereóti dotado de exotismo e erotismo desses corpos, essas midias não se tornam apenas um veículo desse rótulo erroneo de mulheres negras, mas também uma arma que propaga e fortalece o enraizado estigma dos corpos dessas mulheres,
Em 1º de outubro de 2019, a profissional de relações públicas Cáren Cruz denunciou uma descoberta feita enquanto fazia uma pesquisa, onde descobriu que os resultado de busca de termos como "mulheres negras dando aula" no Google eram conteúdos pornográficos explicitos e de fato, mulheres negras são eroticamente objetificadas pela midia que perpetua o retrato da sociedade que é racista e sexista onde mulheres são colocadas numa posição submissa aos homens inclusive no sexo e no mais mulheres negras tem seus corpos estereotipados como desejo sexual, um exemplo disso é a pesquisa feita em 2019 pela plataforma PornHub na qual constata que o termo "hot black" (negra gostosa no português) é o 4º termo mais buscado na plataforma. Não é surpresa que termos como "brasileiras negras" "negras experientes" ou "negras gostosas" sejam alguns dos termos mais buscados em plataformas de pomografia, isso faz evidente a hiper sexualização histórica da mulher negra, que se propaga por veículos como essas plataformas que explanam o retrato da sociedade e o padrão de beleza e prazer destinado a mulheres onde essas são colocadas como profissionais e limitadas sexualmente, deixando nítida a orotização racista e influenciando a construção da invisibilidade de mulheres negras. Nesse contexto têm-se:
"Claro que todas as mulheres estão vulneráveis, suscetíveis a essa violência sexual. Mas quando a gente fala da mulher negra existe esse componente a mais que é o racismo. Existe também essa questão de ultra sensualizar a mulher negra, colocar ela como objeto sexual, como lasciva (Djamila Ribeiro, 2016)
No comentário feito pela escritora e representante do feminismo negro, Djamila Ribeiro, numa entrevista dada para a revista El País, a escritora explana a necessidade de se ler a erotização de mulheres negras como uma violência historicamente construida e até nos dias atuais romantizada. Esse processo histórico de desumanização de mulheres negras enralza a estrutura da solidão da mulher negra, que quando tem seus corpos estereotipados e sua sensibilidade negada, são colocadas numa posição inviabilizada e limitada do objeto sexual. Nesse sentido, Djamila defende que a erotização racista não só inviabiliza a sensibilidade de mulheres negras, mas também tira dessas mulheres o patrimônio e o controle de seus corpos. fazendo com que muitas vezes essas mesmas mulheres tenham a percepção de que não merecem a sensibilidade própria ou alheia.
A propagação desses estereótipos e objetificação deslegitimam a luta de mulheres negras por representatividade, já que quando esses corpos são colocados em evidência nas midias sociais são geralmente colocados em posições dotadas de estereótipo e erotismo, fortalecendo a naturalização da violência sofrida por mulheres negras e fazendo real e acessível para a sociedade os rótulos enraizados em seus corpos e em sua existência, ambos limitados pelo erotismo racista. Como uma das diversas, e todas ligadas, consequências dessa objetificação da mulher negra, é possível destacar o espaço de romantização das ações do machismo dotado de racismo e sexismo, fazendo com que a superioridade masculina seja não só um estigma histórico não superado, mas também base da naturalização da erotização de corpos de mulheres negras, que reflete no todo social levando a romantização do estereótipo, do assédio e até mesmo do estupro. Nesse sentido, ainda na entrevista para a El Paris, Djamila afirma:
Desde " muito cedo o menino foi criado para ser o macho, pra ser o
provedor, o violento, o agressivo. Se a gente vive em uma sociedade onde os homens estupram as mulheres, é porque a gente está criando homens que acham que podem fazer isso. Isso deveria ser o ponto principal" (
Djamila Ribeiro, 2016)
È necessária a explanação do por que o estupro existe, e principalmente o estupro de mulheres negras, numa sociedade em que a hegemonia masculina e a objetificação dessas mulheres fundamentam e romantizam a violência sofrida por essas. Uma pesquisa feita pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) em 2017, aponta que dos estupros registrados no Brasil, 73% são de mulheres negras, isso evidencia não só a demanda causada pelo machismo, mas certifica que o estupro também é uma violência racista e a erotização dessas mulheres amplia esses efeitos, provando que a objetificação de mulheres negras não só fundamenta a violência e a solidão da mulher preta, mas faz dos corpos dessas mulheres um alvo explícito.
A objetificação da mulher preta no Brasil é histórica e se fortalece à medida que a sociedade usufrui da acessível reprodução desse estigma sociocultural por meios dos veículos da sociedade tecnológica, fazendo da midia uma arma. Sendo assim, se faz necessária a conscientização da sociedade evidenciando que a erotização racista dessas mulheres é real e ofende os direitos humanos e a existência dessas, por tanto é cabível a utilização das midias sociais no processo de conscientização da sociedade e dessas mulheres, humanizando esses corpos, devolvendo a esses a sensibilidade. Assim, os meios tecnológicos e culturais junto a educação podem desmitificar o estereótipo e o erotismo colocados nesses corpos, fazendo da educação veículo para o combate da objetificação de mulheres negras no Brasil, pois parafraseando o pensador Aristóteles, a educação pode ter raizes amargas mas oferece frutos doces. Contudo o processo de conscientização e combate à erotização racista que faz de mulheres negras vítimas é longo, mas necessário e urgente.
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